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O Homem por Trás da Lenda

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Miguel Ângelo Volpato e Felipe Augusto de Sousa

Um despretensioso quadro biográfico sobre o fundador da Ordem DeMolay.

Frank Sherman Land é uma figura ímpar quando se trata de seu legado. Todos os anos, milhares de DeMolays brasileiros são chamados a honrar a sua memória no mês de novembro, celebrando a sua vida e a sua grande criação: a Ordem DeMolay. Como bem assinalou o reverendo Herbert Ewing Duncan na sua biografia sobre o fundador, é impossível separar Land, o homem, de "Dad Land", o fundador da Ordem DeMolay, devido ao tanto que ele se dedicou à instituição.


Existe quase que uma mística construída ao redor da imagem de Sherman Land. Isso porque, além de não haver muito material bibliográfico, o pouco que há está longe do alcance do público médio. As principais fontes, as quais incluem entrevistas, reportagens e notícias da instituição e de seu fundador, datadas especialmente dentre as décadas de 1930 e 1960, encontram-se em bibliotecas americanas e são de difícil acesso. As inúmeras edições da revista “International DeMolay Cordon”, do DeMolay Internacional, inaugurada há mais de 90 (noventa anos), representam uma importante fonte de informação. Encontrar uma edição antiga nos dias atuais, entretanto, é uma verdadeira raridade. 


Para o esboço de uma biografia, o melhor material é, sem dúvidas, o livro “Hi, Dad!”, leitura obrigatória para qualquer membro que busque entender a nossa instituição. Outros materiais disponíveis e mais aprofundados são algumas monografias sobre a Ordem DeMolay e os Centennial Moments, disponibilizados pelo DeMolay Internacional. Devido à escassez de fontes, é essencial assinalar que tentar construir um quadro biografico de Land é extremamente dificil e é um projeto sujeito a erros.


Land nasceu em Kansas City, no estado americano do Missouri, no ano de 1890. William Sherman Land, seu pai, trabalhou boa parte da vida como empregado nos “Lumber Yards” americanos (similares às madeireiras brasileiras) e não era um homem bem-sucedido financeiramente. Sua mãe, Elizabeth Lottie Land, tinha apenas dezesseis anos quando deu à luz. A família se mudou cedo para St. Louis, onde Frank viveu alguns dos anos mais felizes de sua infância, destacando-se no estudo bíblico, a ponto de criar uma pequena Escola Dominical no porão de sua casa e receber a alcunha de “O menino pregador de St. Louis”. Isso mudaria em 1902, com a crescente tensão domiciliar entre seus pais culminando na separação do casal, com Elizabeth se deslocando com os filhos de volta para Kansas City. Seriam anos mais difíceis para Frank.


De volta à cidade natal, Land se aproximou de sua avó, que o influenciou significativamente nos seus anos de formação. Segundo ele, ela foi a principal personalidade na sua formação ética e moral durante a sua juventude. Sra. Sampson, como era conhecida, foi, além disso, a grande idealizadora do restaurante da família, e com quem Frank, sua mãe e sua tia se associaram e inauguraram o empreendimento. Tudo indica que Land foi um homem de negócios de sucesso, de modo que se tornou proprietário exclusivo do restaurante em 1909, vendendo-o em 1914 por um montante de oito mil dólares, valor grande, equivalente a quantia atual de cerca de duzentos e cinquenta mil dólares. Sampson também foi responsável por presentear Land em seu aniversário de vinte e um anos com a quantia de cinquenta dólares, o valor exato para que o jovem pudesse iniciar na Maçonaria. Ele se casou com Nell Madeline Swiezenski (que posteriormente adotou o sobrenome de Land) no ano de 1913, com quem ficou junto até o último de seus dias.


Frank, ao iniciar na Maçonaria em 1912, ascendeu de maneira muito rápida. Tornou-se Mestre no mesmo ano em que iniciou, algo comum nos Estados Unidos. Galgou os graus filosóficos, recebendo o Grau 33 do Rito Escocês aos trinta e cinco anos de idade. Ele também trabalhou, de 1914 a 1919, na Comissão Maçônica de Assistência, logo após a venda de seu restaurante. Ali prestava serviço auxiliando maçons e indivíduos diversos a encontrar empregos e meios de arrecadação de capital.


É impossivel ignorar a constante ênfase que Sherman Land deu à boa formação dos jovens, demonstrando isso através da fundação de grupos como o "Young Men's Civic Forum", para a formação de futuros lideres no mundo dos negócios, e programas de "Big Brother", onde buscava aliar rapazes com adultos que pudessem os mentorar. Embora os projetos não tenham sido de muito sucesso, estavam neles a gênese do que seria a Ordem DeMolay.


Segundo a monografia de doutorado de John Rhoads, “DeMolay, the Origin and Development of a Secret Society”, destinada à prestigiada Universidade de Wisconsin, Frank era um homem que se importava muito com a juventude. Ele acreditava fortemente que o mundo pós Primeira Guerra Mundial havia criado uma geração de jovens cínicos, que não respeitavam os pais e haviam esquecido os grandes valores da sociedade ocidental. Ainda segundo o autor, Land acreditava no idealismo, que buscou simbolizar através das Virtudes Cardeais da Ordem DeMolay e representa a força positiva da sociedade, de modo a contrapor com a ascensão de ideologias e movimentos radicais naquela época, a exemplo da Klu Klux Klan, grupo norte-americano que defende a supremacia branca, e, de alguma forma, ganhava força entre a juventude do país. Sherman Land via os serviços sociais e as organizações juvenis como uma forma de contrapor esses movimentos.


Rhoads traz em sua monografia divergências que o nosso fundador tinha em relação a algumas questões do catolicismo, especialmente por enxergar um forte sectarismo, além de ser um defensor do estado laico e entender que a religião católica trazia, naquele período, uma educação orientada para a aristocracia. Isso tende a parecer estranho para nós, brasileiros, e, por isso, merece uma explicação detalhada. É comum, em decorrência da carga cultural do Brasil e em virtude de a maior parte da população nacional ser católica, a associação da noção de religião implicada na Ordem DeMolay com a do catolicismo. Isso também contribui para a criação de uma visão de Frank Sherman Land como se fosse um religioso católico. Essa percepção é, entretanto, errônea, especialmente ao ignorar o fato de que a nação norte-americana é predominantemente protestante. O próprio Land não era católico. O estudo sugere que ele foi adepto da Igreja Congregacional e, posteriormente, da Igreja de Cristo, Cientista, que não deve ser confundida com a Igreja da Cientologia. Trata-se de um galho protestante antitrinitário (não acredita no dogma da Santíssima Trindade), tendo como base os ensinamentos de cura de Jesus Cristo. Vale lembrar, entretanto, que Land nunca impôs sua fé à força para nenhum DeMolay, de modo que a nossa instituição, até os dias atuais, reúne membros das mais diversas religiões.


Dad Land viveu os grandes anos de sua vida entre as décadas de 1920 e 1950, tornando-se figura de grande importância na Maçonaria americana. Passou anos como membro do Grande Conselho (que evoluiu para o Supremo Conselho Internacional e, nos dias de hoje, DeMolay Internacional), colaborando de perto com o crescimento da Ordem DeMolay e dedicando o melhor de seus esforços à juventude. Ao longo dos anos foi premiado, condecorado e idolatrado por jovens de todo o mundo, recebendo, inclusive, a Grande Cruz de Honra do Rito Escocês, sendo, segundo o “Hi, Dad!”, o primeiro do estado do Missouri a recebê-la, o mais jovem e somente o terceiro a ser agraciado vivo, até aquele período. Acabou construindo amizades influentes, como, por exemplo, com Harry S. Truman, Presidente dos Estados Unidos da América entre os anos de 1945 e 1953. Foi membro do Shriners, instituição mundial destinada a maçons e que tem por objetivo a prática da filantropia. Interessante pontuar que, na eleição para o cargo de Potentado Imperial do Shriners para a América do Norte, o próprio Truman fez campanha para que Frank fosse eleito, tendo deixado espalhar que se faria presente na votação. Isso não aconteceu, mas muitos dizem que o mero boato teria auxiliado Frank a ser eleito no ano de 1954. 


Land faleceu em oito de novembro de 1959. O título “Dad Land’s Death is Shock to All” (“A morte de Dad Land é um choque para todos”, em português), da International DeMolay Cordon, não foi um exagero, pois o choque realmente foi imenso. Embora possuísse uma pequena artrite que estava progredindo, ele ainda estava cheio de energia, segundo o Cordon. Inclusive trabalhando no DeMolay Internacional até seus últimos dias. A morte foi um choque tremendo. Frank era um homem extremamente querido por milhares de pessoas e as condolências vieram aos montes e de todos os lugares do país. E se a morte evidencia o legado deixado por um indivíduo, as mais de mil pessoas presentes no enterro de Land, em uma noite fria de final de outono, comprovam o impacto de sua obra sobre toda uma geração.


Frank Sherman Land deixou um patrimônio de cerca de duzentos mil dólares, equivalente a cerca de oito milhões de reais nos dias atuais, que foi destinado a um fundo de auxílio à família. Não deixou filhos, portanto após a morte de seus familiares o valor foi encaminhado para a fundação Frank Sherman Land, que beneficia o DeMolay Internacional.


Fernando Pessoa, poeta português do século XX, foi quem eternizou a frase “Navegar é preciso, viver não é preciso”, e seguiu: “Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso. Só quero torná-la grande, ainda que para isso tenha de ser o meu corpo (e a minha alma) a lenha desse fogo”. Se alguém certamente viveu sob esse lema, embora é provável que nunca o tenha escutado, foi Frank Sherman Land. Ele doou a sua vida e o seu esforço no sentido de engrandecer a juventude de sua nação e do mundo, destinando toda a sua existência a rapazes cujas virtudes fossem capazes de criar uma sociedade melhor. Land, como qualquer ser humano, não era perfeito. Tampouco foi o “mito” que alguns tentar criar. Frank foi apenas um homem que, dentre erros e acertos, consagrou o melhor de seus esforços na busca pela melhoria da humanidade. Acima de tudo, o seu grande legado está essencialmente no fato de ser comum. É a prova de que pessoas normais, com virtudes e dedicação, são capazes de mudar vidas através de feitos extraordinários.


REFERÊNCIAS


Hinck, John M. A Case Study of The Membership Growth Program for the International Order of DeMolay, a Nonprofit Youth Leadership Organization. 2003


RHOADS, JOHN KENNETH. DEMOLAY: THE ORIGIN AND DEVELOPMENT OF A SECRET

SOCIETY. University of Wisconsin - 1960


https://demolay.org/wp-content/uploads/2018/07/Centennial-Celebration-Moments-1.pdf


https://demolay.org/wp-content/uploads/2018/07/Centennial-Celebration-Moments-2.pdf


https://demolay.org/wp-content/uploads/2018/07/Accepting-the-Challenge-Centennial-Celebration-Moment-3.pdf


https://demolay.org/wp-content/uploads/2019/02/Centennial-Celebration-Moments-34.pdf


https://demolay.org/wp-content/uploads/2019/03/Centennial-Celebration-Moments-35.pdf


https://demolay.org/wp-content/uploads/2019/03/Centennial-Celebration-Moments-37.pdf


“Dad Land’s Death is Shock to All’ DeMolay International Cordon 1959


“Hi, Dad! A Story About Frank S. Land and The Order of DeMolay” Herbert E. Duncan

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